Os almoços grátis do socialismo

Imagine que é sócio de um negócio que, no último ano, conseguiu criar 10 milhões de euros de dinheiro. Este negócio tem um risco mínimo, pois para além de ter como parceiro uma entidade pública, também oferece serviços essenciais à população em regime de monopólio. Isto significa que terá sempre clientela assegurada e que nunca estará sujeito à concorrência de ninguém. Portanto, se no último ano conseguiu libertar 10 milhões, no ano seguinte irá libertar mais um pouco, e assim sucessivamente, para toda a vida. Receber 5 milhões ou mais por ano (50% de 10 milhões), é ou não um bom negócio?

Agora, imagine que existe uma pessoa interessada em comprar a sua parte de 50% do negócio. Se chegarem a acordo, o valor que lhe pagarem vai investir novamente para continuar a obter a mesma rendibilidade. E já sabe em quê: títulos AAA da dívida pública a dez anos na zona euro, pois o nível de risco também é baixo. Como a média de remuneração desses títulos tem estado em 2%[1], para obter os 5 milhões todos os anos, teria de investir um capital de 250 milhões.

Agora, a pergunta a que já todos sabemos responder: por quanto está disposto a vender a sua quota de 50%? 250 milhões, certo?

Vamos agora ver um caso semelhante. A AGERE é detida em 49% por privados. Nos últimos seis anos tem criado riqueza para os accionistas a uma média de 12,6 milhões de euros por ano[2], valor que é dividido pela CMB e pelos privados. Ou seja, cabe a estes últimos o valor de 6,2 milhões de euros, com tendência a crescer todos os anos. Se os privados acedessem a vender a sua quota na AGERE, estariam no direito de obter um valor que, ao ser investido, lhes permitisse obter algo semelhante a 6,2 milhões.

Ora bem, 2% de 310 milhões dá exactamente 6,2 milhões. 310 milhões é o valor de partida para as negociações de remunicipalização da AGERE. Não considerando qualquer crescimento.

O que pode ser questionado nestas contas? Por exemplo: a) o risco é superior aos títulos de governos como a Alemanha, Dinamarca, Suíça, etc., b) é muito provável que a AGERE não dure mais de 20 anos.

Vamos então refazer os cálculos para o pior cenário.

Para um espaço de apenas 20 anos, uma remuneração de 4,3%[3] (muito superior aos 2% iniciais) e sempre com a mesma facturação, a quota parte dos privados vale 82 milhões de euros.

Os cálculos do valor da participação numa empresa fazem-se assim. Vemos quanto valem hoje, os “lucros” que a empresa vai dar-nos nos próximos anos. A premissa do Partido Socialista de que a “remunicipalização [da AGERE é] passível de ser financiada pelos próprios lucros, sólidos e constantes, que a mesma apresenta”, pressupõe que os privados estão dispostos a vender a sua participação ao desbarato. Pressupõe que os privados não sabem fazer contas, ou se sabem, estão dispostos a abdicar de uma parte dos “lucros” que podem obter, para fazerem um favor ao outro sócio, que é a Câmara Municipal de Braga.

Sim, meus amigos, há quem ainda tenha a ilusão dos almoços grátis.

 

[1] https://sdw.ecb.europa.eu/quickview.do?SERIES_KEY=165.YC.B.U2.EUR.4F.G_N_A.SV_C_YM.SR_10Y

[2] Free cash flow to equity calculado para o período 2015-2020, com a seguinte fórmula: EBIT – IRC + Depreciações e amortizações – Investimento em necessidades de fundo de maneio – CapEx – Pagamentos a financiadores.

[3] Considerando um beta unitário, remuneração exigida aos capitais próprios de 6,85%, remuneração de capitais alheios e estrutura de capitais da AGERE apresentada nas demonstrações financeiras de 2020. Remuneração exigida aos capitais próprios, consultada em 22/11/2021: https://pages.stern.nyu.edu/~adamodar/New_Home_Page/datafile/ctryprem.html

 

Publicado em 15 de Dezembro de 2021 no Correio do Minho

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