As Décadas Perdidas: Ser radical embrutece o coração mas, pior que isso, embrutece o cérebro (Parte 2)

De facto, não se pode negar o investimento socialista realizado no SNS, mas permanece a dúvida se estará a ser bem aplicado. Não existe uma reforma na Saúde digna desse nome desde 2002 (“apenas remendos, muitos profissionais e muito dinheiro sem que isto represente um aumento da produção” como referido por administrador hospitalar em debate promovido pelo Município de Braga no passado dia 3 de Abril).

Aqui encontramos um exemplo que demonstra a diferença entre dar capital e ser liberal. Liberalizar o acesso à saúde deveria ser o desígnio de qualquer Ministro da Saúde, mas temos um ministro acompanhado de um CEO que não conseguem resolver o número cada vez maior de utentes sem médico de família (> 1,5 milhões de utentes – 01-04-2023) e que acreditam que “as listas de espera são maiores porque a procura cresceu mais de 20%”.

É bom ter a noção que o Inverno demográfico aumentará essa procura e que mostrar aumento de produção em Saúde com base em números de consultas hospitalares e números recorde de cirurgias é curto para demonstrar que a melhor panacea está a ser oferecida. A valorização do trabalho deverá passar pela medição de resultados, não só económicos, mas sobretudo em valor para o doente. Mais consultas, mais cirurgias, pode não significar melhores cuidados e revelar até as insuficiências de um sistema que não promova a prevenção, a inclusão e os cuidados de proximidade.

A prevenção em Saúde, o acesso a exames, tratamento e referenciações atempadas, fica ferida de morte deslocando as pessoas forçosamente para as urgências hospitalares. A via de acesso primordial ao SNS não pode ser a urgência (em 2022 ocorreram 6 232 301 episódios de urgências [1]) e é curto pensar que a solução passaria por investir de forma faraónica nos serviços digitais SNS24.

De acordo com dados da Pordata, em 2001 existiam em Portugal 33 233 médicos (4600 de Medicina Geral e Familiar, 1351 de Ginecologia-Obstetrícia, 1307 de Cirurgia Geral, 860 de Ortopedia, 1329 de Pediatria e 876 de Psiquiatria). Vinte anos depois, em 2021, existiam em Portugal 58 735 médicos (8198 de Medicina Geral e Familiar, 1850 de Ginecologia-Obstetrícia, 1831 de Cirurgia Geral, 1315 de Ortopedia, 2284 de Pediatria e 1294 de Psiquiatria). O número de médicos não especialistas passou de 11 584 em 2001 para 22 590 em 2021. Em 2001, existiam 39 529 enfermeiros e em 2021 o número era superior a 80 000. Em 2001, existiam 3765 dentistas e em 2021 contabilizaram-se 11 458.

De acordo com os dados da OMS/EUROSTAT, Portugal ocupava com distinção o 2º lugar do pódio dos países da União Europeia (UE) a 27 com mais médicos por 100 mil habitantes em 2020, mas a proporção da população com 16 ou mais anos com necessidades insatisfeitas de cuidados médicos por motivos financeiros, devido às listas de espera ou à distância aumentou de 1,1% (1,3% mulheres e 0,9% homens) em 2008 para 2,3% em 2021 (3,0% mulheres e 1,5% homens). Subimos, ou melhor descemos, cegamente da posição 19º para a 10º em 13 anos no grupo de países da UE. Talvez o 13 dê azar e agora há quem acredite que a coisa se inverta. Não creio. A cegueira ideológica não permite ver a sangria de profissionais altamente qualificados para reforçar os quadros de outros países? É o capital investido que se perde que compromete a qualidade assistencial nesta como noutras áreas do País. Os radicalismos, como é seu apanágio, e de modo semelhante às rendas e alimentos, também aqui defenderam no passado “um teto” que impedisse a saída destes profissionais do SNS. Ao invés de criar riqueza suficiente para garantir condições necessárias de atratividade para os médicos e enfermeiros permanecerem no SNS, julgou ser possível impor a força autoritária do Estado para depois de amarrar os utentes às filas de espera, agrilhoar também os médicos ao serviço público.

Impor tetos, limites ao livre arbítrio, é uma forma de radicalismo que conduz à estagnação. É não dar motivos para produzir ou criar. É minorizar e retirar responsabilidade aos cidadãos. É ser entidade permissiva que sempre auxilia mas não reforma e por isso não ajuda. É condenar o País à representação artística trágica da família de acrobatas de Paul Gustave Doré la famille du saltimbanque (l´enfant blessé) que perde o seu futuro e a razão de viver.

Mas sejamos optimistas, a alternativa existe: ser liberal não é ser do capital, é compreender a importância do capital para não ser defensor do que é radical. O liberalismo é moderado e faz falta a Portugal.

 

[1] fonte: https://transparencia.sns.gov.pt)

 

Por João Nascimento, Médico e Membro da Iniciativa Liberal

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