Depois de Rui Rio ter excluído finalmente a possibilidade de o Chega fazer parte de qualquer solução antes ou depois das próximas legislativas, André Ventura, em retaliação, comunicou ao país a intenção de retirar o apoio ao PSD nos Açores, abrindo a porta para um regresso do PS ao governo regional.
Independentemente das razões que justificam essa decisão, trata-se de um tremendo tiro no pé. A partir de agora fica claro, se ainda não estivesse, que o Chega pode servir de contentor para os votos do ressentimento, mas que é impossível proceder à sua reciclagem e aproveitamento para qualquer outra finalidade. O voto no Chega, na perspectiva de soluções não socialistas de governação, passou a ser, na melhor das hipóteses, um voto inútil.
Mas, mais do que isso, a partir do momento em que o Chega é considerado um parceiro indesejável pelos partidos do espaço não socialista (antes do PSD, já a Iniciativa Liberal tinha há muito declarado não estar disponível para entendimentos e a posição do CDS é cada vez mais irrelevante) e que o próprio partido de André Ventura reage a essa circunstância auto-excluindo-se de entendimentos existentes e futuros, a consequência prática é evidente: o voto no Chega não soma no espaço não socialista. Pelo contrário, retira-lhe força como alternativa de governação. Sendo ainda mais pragmáticos, por muito que isso custe a potenciais eleitores do partido de André Ventura: um voto no Chega passou a ser, em aritmética eleitoral, um voto no Partido Socialista.
Votar no Chega não envolve, assim, apenas a questão ética ditada pelas linhas vermelhas do populismo básico, da xenofobia e do ressabiamento. A partir de agora, o voto no partido de Ventura encerra também o problema prático da opção por uma estrada que, por muitas voltas que se dê, desemboca sempre no Largo do Rato e que, eventualmente, promove a continuação do PS, do PCP e do Bloco de Esquerda no poder.