Salvar o SNS do socialismo selvagem

É o socialismo selvagem que permite que os cargos de gestão sejam enxameados por clientelas políticas sem preparação e sem competência. É o socialismo selvagem que centraliza decisões de gestão corrente no Ministério das Finanças e atrofia o funcionamento das unidades

As grávidas portuguesas foram submetidas nas últimas semanas a uma espécie de jogo de fortuna e azar. Nos dias de sorte, podem beneficiar de acompanhamento médico urgente em unidades mais ou menos próximas da sua residência. Nos dias menos favoráveis, arriscam-se a ter de fazer quase duas horas de caminho, como acontece às grávidas de Castelo de Vide que tenham de deslocar-se ao Hospital de Évora ou às de Sagres que sejam obrigadas a dirigir-se a Faro.

No entanto, sendo esta uma realidade especialmente chocante, dada a condição em que se encontram as mulheres que são submetidas a estes fatores adicionais de desconforto e ansiedade, estamos apenas a ver a face mais evidente de um problema mais vasto que se estende muito para lá das urgências desta ou daquela especialidade. Foi, todavia, preciso chegar ao descalabro que presenciámos nos últimos dias para que Presidente da República, primeiro-ministro e ministra da Saúde viessem reconhecer, depois de várias tentativas de desvalorizar a situação, que estamos perante um problema grave e estrutural.

Vamos ser claros. A necessidade sentida cada vez por mais portugueses de recorrerem a um seguro de saúde, a falta de médicos de família para um milhão e quatrocentos mil cidadãos, as listas de espera, as insuficiências no acompanhamento de doentes oncológicos recentemente assinaladas pelo Tribunal de Contas, a degradação dos indicadores de mortalidade materna nos últimos anos, o aumento da taxa de mortalidade global em junho sem que exista uma explicação evidente para o fenómeno e o caos que se vive nas urgências, tudo isto são sinais evidentes de que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) está profundamente doente.

Aqui chegados, e como sucede em qualquer doença, é fundamental não ficar pela identificação dos sintomas. Importa conhecer as causas para, depois, aplicar as terapêuticas. Ora, o mal que atormenta o SNS é aquilo a que poderíamos chamar de socialismo selvagem. Foi o socialismo selvagem que impôs o dogma de que os serviços de saúde públicos têm obrigatoriamente de ser prestados por entidades públicas. Foi o socialismo selvagem protagonizado por PCP, Bloco de Esquerda e PS que levou à extinção das PPP da saúde, soluções que funcionavam em termos de qualidade e eficiência, como foi reconhecido pelo Tribunal de Contas.

É o socialismo selvagem que afasta qualquer lógica de concorrência entre diferentes unidades de saúde. É o socialismo selvagem que impede que os princípios de gestão e os indicadores de desempenho das unidades de saúde sejam definidos e monitorizados com rigor (como acontecia, aliás, nas PPP). Foi o socialismo selvagem que impôs a natureza absolutamente excecional do recurso a PPP na nova Lei de Bases da Saúde.

É o socialismo selvagem que paralisa quaisquer tentativas de concretização de um sistema sério de avaliação e incentivo dos profissionais de saúde. É o socialismo selvagem que permite que os cargos de gestão sejam enxameados por clientelas políticas sem preparação e sem competência. É o socialismo selvagem que centraliza decisões de gestão corrente no Ministério das Finanças e atrofia o funcionamento das unidades. Foi o socialismo selvagem que empurrou o país para décadas de estagnação, exaurindo recursos e levando a que não existam meios adequados para investir e compensar. E é o socialismo selvagem que toma opções erradas, desbaratando os escassos meios ainda disponíveis em investimentos ruinosos, descurando áreas fundamentais como a saúde.

A solução é, portanto, óbvia: é urgente salvar o SNS do socialismo selvagem. É preciso, antes de mais, pôr o país a crescer para que existam recursos para investir nas funções essenciais do Estado. É necessário, depois, enterrar os dogmas. A concorrência é útil e necessária. As parcerias com privados são um instrumento de gestão adequado ao qual se pode recorrer sempre que a solução seja a mais vantajosa. Os hospitais do SNS, geridos por entidades públicas ou privadas, não podem ser o destino de todas as situações, mas apenas das urgentes, devendo reforçar-se a rede de unidades que, com gestão pública ou privada, permitem triar os casos que não precisam de chegar a uma urgência hospitalar. Os gestores hospitalares devem ser escolhidos pela sua competência e deve ser-lhes dada autonomia para exercerem funções. E o desempenho dos profissionais de saúde deve ser avaliado e o seu mérito incentivado e reconhecido.

Se não for este o caminho escolhido, de nada vai adiantar atirar mais dinheiro sobre os problemas, até porque ninguém sabe onde se irá buscar esse dinheiro.

 
Rui Rocha

Membro da Comissão Executiva da Iniciativa Liberal

 in Expresso,  Lynk

 20-Jun-2022

 
 
 

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