Violação

Aquele que se alimentou com bolotas que colheu sob um carvalho, ou das maçãs que retirou das árvores na floresta, certamente que se apropriou deles para si. Ninguém pode negar que a alimentação é sua. Pergunto então: Quando começaram a pertencer-lhe? Quando as digeriu? Quando as comeu? Quando as cozinhou? Quando as levou para casa? ou Quando as apanhou?

Assim começa o raciocínio de John Locke sobre um dos direitos que assiste a cada um de nós: o direito de propriedade . Este direito veio a mostrar-se fundamental no desenvolvimento das economias modernas, tornando-se o garante da recompensa do indivíduo em poder vir a colher os frutos do seu esforço. Quando eu estou a cuidar de um bem que é meu, tenho todo o incentivo a fazê-lo da melhor forma que sou capaz, pois irei usufruir de todo os benefícios que esse bem pode proporcionar¬ me; tal como perder esses benefícios, caso o bem pereça.

É este incentivo que tem levado, desde sempre, as pessoas a realizar um investimento. E vamos clarificar este termo. Os recursos que temos, ou são investidos, ou são consumidos. Seja dinheiro, tempo, ou um bem. Portanto, investir é trocar a possibilidade de uma satisfação imediata e segura (o consumo) por satisfações diferidas no tempo e sujeitas a incerteza (os resultados do investimento). Portanto, se eu podia ter consumido as maçãs que colhi e decidi fazer compota para vender, tenho o direito de ficar com o rendimento dessa actividade. E porque o consumo das maçãs era certo, enquanto que a venda da compota pode correr mal em várias fases, é natural que eu só esteja disposto a fazer essa troca se vier a ganhar algo com isso. O risco que corro deve ser remunerado.

Esse risco tem a ver com o insucesso da empresa, pois este fracasso frustra todas as expectativas e gera prejuízos à colectividade onde se encontra inserida. Quando alguém está disposto a investir numa actividade empresarial, cria um mecanismo que reúne investidores, incentiva fornecedores, gera postos de trabalho e produz tributos para o Estado. Assim sucedeu, por exemplo, para quem investiu em espaços de diversão nocturna. O empresário, que podia ter esbanjado o seu dinheiro em viagens de férias, em almoços e jantares, optou por investi-lo, para mais tarde poder colher os frutos desse investimento. Está no seu direito. Que é plenamente reconhecido no nosso país.

Porém, esse direito foi-lhe furtado durante quase dois anos. E o prevaricador foi o Governo português – exactamente quem tem por função assegurar-lhe os direitos, liberdades e garantias.

Desde Março de 2020, estes espaços foram obrigados a ter as portas encerradas durante quase dois anos, sem que tivessem direito a uma compensação sobre os custos que essa medida lhes trouxe. Sim, houve algumas medidas para apoio dos empresários em geral, independentemente do tipo de actividade em questão, (sob o cumprimento de determinados pressupostos), mas que deixaram de fora muitos empresários que não conseguiam cumpri-las. Não houve uma compensação directa às actividades que estiveram compulsivamente encerradas, o que configurou um furto aos direitos de propriedade por parte do Governo.

O encerramento foi necessário por motivos de saúde pública? Se os estabelecimentos tivessem continuado abertos, os prejuízos para a sociedade seriam enormes? Se as respostas são afirmativas, então a decisão de obrigar ao seu encerramento, foi acertada. A sociedade, ou seja, todos nós (incluindo os empresários desses estabelecimentos), ficamos a ganhar com o encerramento compulsivo. Mas se todos nós ficamos a ganhar com isso, então todos nós deveríamos ter suportado esse custo. E não apenas aquelas pessoas que tiveram o azar de ter escolhido esta actividade para abdicar das viagens de férias e dos almoços e jantares.

Estes empresários, bem como os de outras actividades compulsivamente encerradas, viram os seus direitos violados, e o Governo português foi o violador. Que infelizmente, vai escapar impune.

“As mais sagradas leis da justiça, por conseguinte, aquelas cuja violação parece clamar mais alto por vingança e punição, são as leis que protegem a vida e a pessoa do próximo; a seguir, vêm as que protegem os seus bens e posses; por último, as que protegem o que se chama os seus direitos pessoais, ou o que lhe é devido pelas promessas de outros. O violador das mais sagradas leis da justiça, jamais poderá refletir sobre os sentimentos que a humanidade deve nutrir por ele, sem sentir todas as agonias de vergonha, do horror e da consternação.”

Adam Smith, “Teoria dos Sentimentos Morais”, 1759

 

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13 Abr 2022

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